Colapso de bancos nos EUA e crise no Credit Suisse podem se alastrar pelo mundo?
Editor2023-03-16T18:40:13-03:00Três crises envolvendo grandes bancos em pouco mais de uma semana abalaram mercados e despertaram um sinal vermelho entre autoridades monetárias em todo o planeta.
Apesar de as crises serem localizadas — problemas em balanços e saques em massa por correntistas — qualquer crise em um banco tem potencial para contaminar todas as outras instituições financeiras do país ou até no exterior.
Isso acontece porque os bancos emprestam dinheiro entre si — portanto a quebra de uma instituição pode gerar problemas financeiros para as demais.
Analistas destacam que quando um sentimento de medo se espalha entre correntistas de diversos bancos, pode haver uma corrida em massa de clientes para sacarem os seus depósitos — algo que levaria a uma quebradeira mais ampla no setor, com consequências para todas as economias.
Nesta semana, diante das notícias sobre os problemas nos bancos, o presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou medidas para tranquilizar os americanos preocupados com o sistema bancário. No anúncio, ele disse: “Seus depósitos estarão lá quando vocês precisarem deles.”
Três problemas
O primeiro problema aconteceu na semana passada, nos Estados Unidos, com o colapso do Silicon Valley Bank, o 16º maior credor do país. Dois dias depois, autoridades anunciaram uma intervenção no Signature Bank de Nova York .
Esta semana foi a vez do gigante suíço Credit Suisse, cujas ações desabaram 24% na quarta-feira (15/3), depois que o Banco afirmou ter encontrado “fraquezas” em seus relatórios financeiros.
Os temores de uma crise bancária mais ampla provocaram fortes quedas nas bolsas de valores de todo o mundo na quarta-feira.
As autoridades monetárias de EUA e Suíça reagiram rapidamente para que o problema localizado das instituições não se tornasse uma crise geral — com corrida a diversos bancos em diversos países.
O Credit Suisse tomará empréstimos de até 50 bilhões de francos suíços (US$ 54 bilhões ou R$ 285 bilhões) do banco central do país para reforçar suas finanças.
O banco central da Suíça disse que o Credit Suisse tem dinheiro suficiente para não quebrar e alertou que está pronto para intervir caso seja necessário.
O banco central dos EUA foi forçado a intervir para evitar uma corrida aos depósitos bancários à medida que o pânico se espalhava.
Nesta quinta-feira (16/03), diante dos anúncios dos bancos centrais, os mercados mundiais mostravam recuperação.
‘Grande demais para quebrar’
O economista Nouriel Roubini — que ficou famoso por alertar o mundo para a crise financeira em 2008, que começou com a quebra do banco americano Lehman Brothers — disse à BBC que a possível quebra de um banco como o Credit Suisse teria consequências graves para a economia global.
O banco é considerado por muitos como “grande demais para quebrar” — um termo usado para instituições financeiras cujas falências poderiam ameaçar a economia global.
“O Silicon Valley Bank era apenas um banco de ativos de US$ 200 bilhões e causou efeitos cascata nos mercados financeiros globais, enquanto o Credit Suisse é um banco de ativos de US$ 700 bilhões, então um colapso do Credit Suisse teria um efeito muito mais sistêmico e contagioso na economia e nos mercados financeiros”, disse Roubini à BBC.
“As reservas de caixa do banco podem ser fortes, mas no ano passado eles perderam cerca de 100 bilhões de francos suíços (US$ 107 bilhões) em depósitos”, afirmou Robini.
“Sempre que um banco perde depósitos — e isso pode acontecer da noite para o dia — ele pode entrar em colapso porque está ficando sem dinheiro, então é preciso vender ativos líquidos, o que provoca a falência. Foi o que aconteceu com o Silicon Valley Bank. Isso pode acontecer até no caso do Credit Suisse. Eu diria que seria outro ‘momento Lehman’ no mundo, porque esse banco é enorme, é global e isso teria efeitos sistêmicos.”
Larry Fink, o fundador da maior gestora de ativos do mundo, a Blackrock, disse que é possível que vejamos uma “crise lenta” que pode arrastar centenas de pequenos bancos para a falência, como a crise de poupança e empréstimos da década de 1980, quando mais de mil bancos pequenos faliram nos EUA.
Autoridades preocupadas
Os problemas financeiros do Credit Suisse não ficaram circunscritos apenas às autoridades monetárias da Suíça.
Um ex vice-diretor do Banco da Inglaterra disse à BBC que os bancos centrais de Suíça e EUA estão sinalizando aos mercados em todo o mundo que esses problemas serão contidos localmente, antes que possam se alastrar pelo mundo.
John Gieve disse que, no caso do Credit Suisse, isso provavelmente será suficiente para impedir que a crise do banco se espalhasse para outros setores e países.
“O que vimos da noite para o dia é o banco central suíço dizendo ‘não vamos deixar isso virar um colapso caótico'”, disse Gieve à BBC.
“Não sei o que o futuro reserva para o Credit Suisse, mas até agora eles ainda estão vivos e parece que o banco central suíço garantirá que estejam vivos por tempo suficiente para reorganizarem seus negócios para o futuro.”
‘Fraquezas materiais’
O Credit Suisse, fundado em 1856, enfrentou uma série de escândalos nos últimos anos, incluindo acusações de lavagem de dinheiro, alegações de espionagem e pedidos de demissão no alto escalão.
O banco teve prejuízo em 2021 e 2022, e avisou seus acionistas de que não previa voltar a dar lucros até o ano que vem.
A divulgação do banco na terça-feira (14/3) sobre “fraqueza material” em seus balanços financeiros renovou as preocupações dos investidores.
Daniel Davies, diretor-gerente da Frontline Analysts e ex-analista bancário do Credit Suisse, disse que a “base de clientes milionários e bilionários do banco parece ter chegado ao fim de sua tolerância e eles têm retirado dinheiro do banco nos últimos seis meses em um ritmo cada vez maior”.
Segundo o analista, a situação no Credit Suisse é preocupante o suficiente para fazer com que o Banco da Inglaterra faça sondagens junto ao Banco Central da Suíça sobre as perspectivas da crise no banco.
“Porque a natureza dessas crises é que, quando você tem uma corrida em massa por saques, isso funciona como um tsunami — não há nada que as pessoas possam fazer pode pará-la. A única coisa que você pode fazer é impedir isso antes que se transforme em uma corrida aos bancos e as únicas pessoas que podem fazer isso são as que trabalham nos bancos centrais.”
A tensão aumentou ainda mais depois que o maior acionista do Credit Suisse, o Saudi National Bank, disse que não compraria mais ações do banco suíço por motivos regulatórios. Os primeiros-ministros da Espanha e da França se pronunciaram em uma tentativa de aliviar os temores.
O colapso do Silicon Valley Bank também alimentou preocupações sobre o valor dos títulos mantidos pelos bancos, já que o aumento das taxas de juros tornou esses títulos menos valiosos.
O Silicon Valley Bank era especializado em empréstimos para empresas de tecnologia. Ele foi fechado por reguladores dos EUA que apreenderam seus ativos na sexta-feira. Essa foi a maior quebra de um banco dos EUA desde a crise financeira de 2008.
O banco estava tentando levantar dinheiro para cobrir uma perda com a venda de ativos afetados por taxas de juros mais altas nos EUA.
A notícia dos problemas levou uma corrida dos clientes para sacar fundos, criando uma crise de fluxo de caixa.
No domingo, as autoridades americanas também assumiram o controle do Signature Bank em Nova York, que tinha muitos clientes envolvidos com criptomoedas e era vista como a instituição vulnerável a esse tipo de saques em massa.
E agora?
Analistas estão divididos sobre qual será o impacto dos problemas bancários desta semana em toda a economia global — mesmo que não haja uma corrida aos bancos.
A economia global vive um momento de dificuldades — com grandes aumentos de preços em diversas partes do planeta (como EUA, Europa e Brasil). Desde o ano passado, as autoridades monetárias vêm respondendo a essa crise com aumento das taxas básicas de juros.
Juros mais altos costumam provocar queda na inflação. Mas taxas elevadas também podem ter efeitos adversos na economia, por aumentarem os custos de investimentos e empréstimos — com potencial para gerar desemprego e recessão.
Algumas economias, como a do Reino Unido, podem até mesmo entrar em recessão este ano.
Economistas no mundo inteiro e também no Brasil estão debatendo quando o recente ciclo de alta de juros deve chegar ao fim — e quando começará o movimento de corte dos juros.
O ciclo de alta derrubou bolsas em todo o mundo e afetou diversos setores econômicos — sobretudo de tecnologia, onde houve demissões em massa em muitas empresas.
Alguns analistas acreditam que as turbulências dos bancos desta semana farão com que o Banco Central americano interrompa o ciclo de alta dos juros, para dar um certo “alívio” à economia global neste momento de estresse.
“À luz do estresse no sistema bancário, não esperamos mais que o FOMC [comitê do Federal Reserve americano] decida aumentara juros em sua próxima reunião”, afirmou em nota o banco Goldman Sachs.
A próxima reunião das autoridades monetárias americanas sobre os juros acontece na quarta-feira da próxima semana. No mesmo dia, as autoridades brasileiras também se reunirão para decidir sobre a Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira.
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