Big Techs e o novo paradigma do mercado de trabalho – Por: Karina Rehavia, fundadora e CEO da Ollo
As informações que chegam do mercado norte-americano indicam que a onda de demissões em massa nas big techs parece não ter afetado a disposição das pessoas de buscar relações de trabalho mais equilibradas, que conciliem vida pessoal e profissional de forma mais saudável.
Uma pesquisa da consultoria Pollfish com mais de 500 profissionais mostrou que 89% das pessoas que trabalham com tecnologia querem mais flexibilidade e autonomia. Destes, 74% acham o modelo de trabalho freelancer mais atraente do que antes. Além disso, 66% das pessoas que participaram do levantamento disseram ter perdido a confiança em suas empresas.
Estes são apenas os primeiros sinais de um fenômeno cujas consequências, talvez, ainda não estejam claras. De toda forma, estes sinais estão alinhados com as transformações que vêm ocorrendo no mercado profissional desde o início dos anos 2000, que ganharam impulso extra com a pandemia e com o boom do trabalho remoto ou híbrido, reforçados pelo nomadismo digital.
Percebo estas transformações nas conversas rotineiras com profissionais de várias áreas. Para muitas pessoas, crachá, estabilidade e emprego para toda a vida não têm mais o valor que tinham para gerações anteriores. A procura por formas de trabalho mais equilibradas está longe de ser uma busca só das pessoas. Empresas já descobriram que trabalhar com profissionais independentes tem uma série de benefícios, entre eles a flexibilidade na contratação e o acesso a um pool de talentos com diversidade única de perfis, competências e experiências.
Uma tendência mais recente é a chegada deste movimento aos cargos de liderança, com a contratação de executivos e até CEOs sob demanda. A modalidade é cada vez mais usada por startups e permite o acesso a profissionais experientes sem o ônus de um custo fixo, o que muitas vezes esse tipo de empresa não tem como assumir.
Os governos também estão de olho nessa transformação. Desde o final de outubro, Portugal oferece um visto específico para nômades digitais. Em dezembro foi a vez da Espanha, que se juntou a uma lista que já conta com cerca de 40 países, atentos a este novo formato de vida e trabalho.
Em comum, esses países perceberam que as pessoas que adotam o nomadismo digital costumam ter pelo menos duas qualidades desejáveis: conhecimento e iniciativa. “Dinamizar a economia” e criar “micromultinacionais” de exportação de serviços digitais foram duas justificativas que o governo de Portugal usou para defender a criação desse visto especial.
O Brasil também criou um visto semelhante no começo do ano passado, embora ainda não tenha adotado nenhuma política ativa para atrair profissionais independentes e nômades digitais.
Um dos desafios desse mercado livre de talentos é a conexão entre empresas e pessoas. Pela natureza do trabalho autônomo e do nomadismo digital, as pessoas, em sua maioria, estão dispersas e nem sempre são encontradas pelos processos tradicionais usados pelos gestores de RH das empresas, ou por head-hunters.
Há também a questão da seleção de talentos, a negociação dos valores e a efetuação dos pagamentos. É aí que entram plataformas de curadoria de talentos.
Para empresas, é uma forma de ter acesso a uma comunidade de pessoas que seriam difíceis de recrutar de outra forma – e que já passaram por um primeiro e rigoroso processo de seleção.
Para os talentos independentes, é uma maneira de entrar no radar das empresas e, de quebra, facilita os contatos e deixa o processo de negociação do contrato muito mais fluido.
Tudo isso mostra que, mesmo em um mercado de trabalho mais disputado, vamos continuar assistindo a um fortalecimento desse movimento, marcado pela flexibilidade e por uma relação mais horizontal ao alcance de um número cada vez maior de pessoas e empresas.
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