Lei do Divórcio: 45 anos depois, Instituto ainda pode ser aperfeiçoado – Por: Daniel Paes de Almeida é presidente do Colégio Notarial do Brasil — Seção São Paulo, associação dos cartórios de notas paulistas.

Lei do Divórcio: 45 anos depois, Instituto ainda pode ser aperfeiçoado – Por: Daniel Paes de Almeida é presidente do Colégio Notarial do Brasil — Seção São Paulo, associação dos cartórios de notas paulistas.

Este ano, a Lei nº 6.515, que instituiu o divórcio no Brasil, completa 45 anos. De lá para cá a normativa já beneficiou milhares de pessoas que almejavam pôr fim aos seus casamentos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), somente no ano passado, 330 mil casais colocaram um ponto final em seus matrimônios.

O instituto do divórcio foi uma revolução jurídica. Vale lembrar que antes de 1977, havia no ordenamento jurídico a possibilidade do desquite, que tinha como objetivo extinguir as obrigações conjugais, porém não afastava o vínculo matrimonial, e, consequentemente, a possibilidade de as pessoas contraírem outro casamento.

A normativa foi um marco, sobretudo, para as mulheres. Recorrendo à história, o primeiro divórcio praticado no Brasil foi por iniciativa da senhora Arethuza Figueiredo Henrique Silva de Aguiar. À época o caso ganhou repercussão nacional. Hoje, esse quadro não mudou. De acordo com o IBGE, em 2020, das 79.964 dissoluções de casamentos que chegaram ao judiciário sem entendimento das partes, mais da metade (58%) foram motivadas pelo sexo feminino.

É seguro dizer então, que a adoção do divórcio no Brasil é uma pauta sobretudo que diz respeito aos Direitos Humanos, pois assegura ao cidadão o direito a constituir família, um dos direitos mais básicos previstos na nossa Constituição de 1988.

Assim o legislador também vem entendendo ao longo desses últimos 45 anos. O instituto do divórcio está em constante evolução desde 1977. À medida que a sociedade evolui, o Congresso se depara com novas pautas, novos anseios da população. Nesse espaço de tempo, quatro grandes alterações legislativas impactaram diretamente na sociedade, as mais importantes delas, a Lei 11.441, de 2007, e a Emenda Constitucional 66, de 2010. A primeira permitiu a lavratura de divórcios, inventários e partilhas por escrituras públicas, desde que o casal não tenha filhos menores ou incapazes e que o ato seja consensual.

Já a EC 66 colocou fim aos prazos para realização da dissolução do casamento. Antes disso, os casais precisavam estar separados há pelo menos um ano para realizar o divórcio. Hoje, qualquer par que decidir pôr fim ao seu casamento pode ir a um cartório de notas e sair com uma escritura de divórcio em poucas horas.

 

Os números do IBGE (vamos sempre recorrer aos dados oficiais) mostram que as mudanças legislativas realmente atendiam às reivindicações da sociedade. Dois anos após a EC 66 entrar em vigor, os divórcios praticamente dobraram, com o índice crescendo em 99%. Havia, portanto, uma demanda represada, uma grande quantidade de casais que não conseguiam tocar suas vidas, mesmo sabendo que já não queriam que fosse ao lado do parceiro.

Puxando ainda mais para trás e analisando os dados do IBGE é possível chegar à conclusão que na década de 80, o número de dissoluções de casamentos não chegava a 3% do número de matrimônios. Já em 2020, a proporção saltou para 44%. Ou seja, em 40 anos, a cada 10 casamentos, 4 terminam em divórcio.

Desde de 2007, com o advento da Lei 11.441, boa parte desses divórcios é solucionado nos cartórios de notas. Os números do IBGE mostram que um terço dos matrimônios encontram fim na escritura redigida por um tabelião. A facilidade e rapidez da dissolução do casamento via instrumento público tem levado os casais a recorrerem às serventias notariais. Para se ter uma ideia, nos últimos 10 anos (desconsiderando os anos de pandemia), os divórcios extrajudiciais aumentaram mais de 100%, passando de 37.963 em 2009, para 75.767, em 2019.

Porém, nos últimos anos, apesar dos números continuarem avançando, é possível notar que a demanda absorvida pelos cartórios de notas chegou a um platô. O motivo é fácil de identificar e aqui é preciso chamar a atenção para dois pontos: 1) a maior parte dos divórcios judiciais são consensuais, mais precisamente 68%; 2) 56% das dissoluções levadas à Justiça envolvem menores, fator impeditivo pela legislação atual para a extrajudicialização do ato.

Por uma questão de lógica, não é difícil de imaginar que mais de 80% da demanda de divórcios consensuais vão parar no Judiciário por envolverem menores. Esse é um ponto que o legislador precisa refletir. São milhares de cidadãos que poderiam ter suas vidas facilitadas com a extrajudicialização desses atos. Somente em 2020. estamos falando em 140.218 brasileiros que precisaram esperar meses até uma resolução de mérito.

Salvaguardar o menor é importante. Mas se os pais já estão em comum acordo com as questões de guarda e alimentos das crianças e adolescentes, por que então não permitir que o divórcio seja concedido por escritura pública? Neste sentido, já tramitam no Congresso alguns projetos de lei que pretendem consertar essa injustiça contra casais com filhos menores.

 

O mais recente deles é do deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP). O PL 731/21 mantém a participação de promotor de Justiça nesses casos, mas sem a necessidade de judicialização imediata. Pelo texto, o tabelião lavrará a minuta da escritura pública do divórcio, que conterá disposições sobre alimentos e guarda do filho incapaz ou nascituro, e a submeterá ao Ministério Público.

Caso o promotor concordar com as condições, a escritura será lavrada e o divórcio ou separação confirmados. Se ele fizer exigências e o casal aceitar, o tabelião lavrará a escritura com as devidas alterações. Se não concordar, a questão será resolvida apenas na Justiça.

O texto é acertado e propostas como esta precisam ganhar luz no Congresso. Desde 1977, o instituto do divórcio já evoluiu muito, mas ainda necessita deste ajuste no tocante aos casos que envolvam menores. A extrajudicialização é o caminho para milhares de brasileiros. E não vamos nem abordar aqui os benefícios aos cofres públicos e a economia que tal medida traria ao erário. Somente isso já seria tema de outro artigo.

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