Pequenas e médias empresas de tecnologia reclamam sobre a forma como Apple, Google e Amazon copiam suas soluções antes de tirá-las das plataformas
Um levantamento feito pelo jornal americano The New York Times apontou que, ao longo de 2018, a Apple removeu ou restringiu 11 dos 17 aplicativos de controle de tempo de uso da tela, usados principalmente para pais que querem acompanhar o tempo que seus filhos ficam no celular. Segundo as empresas envolvidas nessa restrição, a gigante de tecnologia absorveu as tecnologias usadas nessas soluções para construir seu próprio aplicativo antes de tirá-las da Apple Store.
Porém, com as reclamações e com a atuação de autoridades, a Apple acabou por dar um passo atrás nessa limitação, permitindo que as empresas voltassem a usar algumas das funções que as fizeram perder espaço na Apple Store.
Uma análise da Harvard Business Review aponta que a Amazon copia produtos de terceiros hospedados em seus marketplaces para depois vender suas próprias versões em detrimento dos originais. O resultado: os produtos mais vendidos no marketplace da empresa nos Estados Unidos são próprios, apesar do incontável número de produtos cadastrados no site.
Para limitar o avanço das gigantes sob a atuação das empresas menores, a senadora americana Elizabeth Warren propõe impedir que marketplaces com receita superior a 25 bilhões de dólares ao ano possuam tanto o controle da plataforma de vendas quanto os sellers nela inseridos.
Uma análise do professor associado de Adminstração de Harvard, Feng Zhu, especializado em inovação e na indústria de tecnologia, aponta que, uma das razões para as grandes absorverem, de maneira ética ou não, ideias de empresas menores, é agregar valor às plataformas. O exemplo mais claro é a compra do WhatsApp e do Instagram pelo Facebook, quando esta já era a rede social mais utilizada do mundo.
Outra motivação, porém, tem caráter mais nobre, segundo o professor Zhu. A ideia é garantir que haja maior privacidade do usuário na utilização de algumas ferramentas. O professor conta que o Google decidiu por lançar seu próprio aplicativo de lanterna depois de identificar riscos de vazamento de informações de seus usuários diante do uso de aplicativos terceiros. Além disso, a criação de um aplicativo da própria plataforma reduz a quantidade de apps ou produtos redundantes dentro do marketplace, o que facilita as buscas para o usuário e a qualidade dos produtos oferecidos.
Intel evitou a briga
A Intel decidiu que não entraria em conflito com os terceiros que desenvolviam hardware usando sua linha de produtos. No entendimento da empresa, poderia haver uma debandada de parceiros se a Intel começasse a usar a tecnologia e os processos dos players para desenvolver soluções próprias.
Essa debandada poderia ser incentivada também pelo alto custo dos produtos Intel. Seria mais fácil para o parceiro recorrer ao concorrente do que no caso da Amazon, por exemplo, onde o custo de adesão à plataforma da empresa é baixo. Segundo o professor de Harvard, a Amazon estaria menos preocupada em incomodar as marcas parceiras porque possui outros diferenciais de mercado a oferecer, neste caso, o baixo preço para exposição dos produtos e o alto tráfego de seu marketplace.
Nem tudo são dores
A entrada de gigantes em negócios antes oferecidos exclusivamente por médios e pequenos nem sempre é negativo para os players mais modestos. Estudos indicados pelo professor Zhu apontam que, em alguns casos, a entrada das grandes empresas acaba por gerar um efeito de transbordamento, que vai levar aumento de adesão aos aplicativos semelhantes. É o caso do Google e seu investimento em aplicativos de fotografia, que acabou por aumentar a demanda e derramar parte dela sobre os aplicativos independentes.
Um exemplo mais antigo e eloquente de como o uso pelas grandes empresas de soluções criadas por pequenos pode ser benéfico para os dois lados é o do mundo dos videogames, no qual Microsoft, Sony e Nintendo usaram a expertise dos desenvolvedores de jogos em suas plataformas. Ao mesmo tempo que melhoraram seus produtos, as gigantes catapultaram a demanda de jogos e as vendas dos parceiros.
A questão primordial nessa análise de custo-benefício para os pequenos é o tempo. Os players menores devem identificar o período no qual vão conseguir se beneficiar dessa alavancagem promovida pelas gigantes até lançar novas soluções no mercado. Caso errem no cálculo dessa variável, correm o risco de ver uma gigante fazer tão bem (ou melhor) aquilo que é o seu diferencial de mercado.
Escrito por Raphael Coraccini