Uma beautytech, healthtech e até plataforma de vídeos contornam a crise financeira global e mostram que é possível aumentar o faturamento
Há meses, a pandemia do novo coronavírus vem provocando instabilidade no mercado financeiro e derrubando economias ao redor do mundo. Dados divulgados esta semana pelo IBGE mostram, por exemplo, que a queda da produção na Indústria em abril foi de 18,8% em relação a março, quando o indicador já havia registrado retração de 9%. Esse é o pior resultado para o segmento em, pelo menos, 18 anos.
Negócios resistem à crise
A Pesquisa Industrial Mensal apontou também uma mudança no perfil de consumo, decorrente da quarentena. Se, por um lado, setores de bens duráveis, como veículos e eletrodomésticos, tiveram queda expressiva, outros, como alimentos e itens farmacêuticos, cresceram.
Um levantamento realizado pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico revelou que as compras online na categoria “saúde” aumentaram 131% nos últimos dois meses. A plataforma Suprevida, especializada na contratação de serviços e em produtos médicos para quem precisa de cuidados em domicílio, sentiu na pele esse aumento na demanda: as vendas tiveram aumento de 60% em março e mais que dobraram em abril, confirmando a tendência apontada pela Abcomm.
Segundo o CEO da Suprevida, Rodrigo Correia da Silva, o aumento nas vendas foi impulsionado por clientes B2B, como casas de repouso e outras instituições de saúde, que hoje respondem por 20% da receita da empresa. “O principal desafio neste momento é a disponibilidade de estoques, que além de terem sido consumidos fortemente no começo da crise, não estão sendo repostos na mesma velocidade, dadas as dificuldades logísticas e de câmbio que estão impactando o Brasil hoje”, diz.
Com as orientações de isolamento social, outro setor que cresceu consideravelmente foi o de cursos online. A Samba Tech, especializada em gerenciamento e distribuição de videoaulas, constatou um aumento de 90% no consumo de vídeos online sob demanda entre fevereiro e abril de 2020 em sua plataforma. “Tivemos um crescimento de 308% no consumo dos vídeos via mobile e de 506% no consumo dos vídeos via desktop. Além disso, tivemos um aumento de 68% no total de horas assistidas de conteúdo”, diz o CMO da Samba Tech, Pedro Filizzola.
Efeito Batom
Em meio à pandemia, não são apenas as empresas de saúde ou que oferecem soluções online que estão crescendo: o segmento de beleza também parece resistir às adversidades. O fenômeno, conhecido há décadas e batizado em 2001 de “lipstick index” – ou índice batom – aponta para uma tendência de crescimento nas vendas de cosméticos durante crises econômicas. A teoria é simples: o consumo desses itens seria uma forma de compensar restrições, sem precisar deixar de consumir. Além disso, os cuidados com a beleza impactam positivamente a maioria das pessoas, especialmente em épocas mais conturbadas.
A JustFor You, primeira beauty tech brasileira a usar a inteligência artificial para desenvolver fórmulas personalizadas para cabelos, cresceu 450% desde a última semana de abril. Digital por natureza, a empresa, segundo o CEO Caio de Santi, já estava preparada para a transformação tecnológica pela qual o mercado está passando, e que foi impulsionada pela pandemia. “Quem ainda não era tanto do consumo online viu os benefícios e a urgência em ser. Um exemplo é que, com o isolamento social, lançamos a campanha Abraço Virtual, permitindo que a pessoa compre um produto 100% personalizado para alguém especial, com direito à cartinha que leva uma mensagem criada por ela. Foi um sucesso e um fator que contribuiu diretamente para o aumento das vendas”, diz.
Ainda de acordo com de Santi, a responsabilidade social também passou a ser mais valorizada com a pandemia, e empresas que já tinham esse compromisso acabaram se destacando. Nos próximos meses, a empresa planeja criar pequenos laboratórios de acordo com a demanda, para reduzir o tempo de transporte do produto até o consumidor final.
Para o CEO da JustFor You, uma das lições que a pandemia vai deixar é a clareza sobre o potencial que o ser humano e o mercado têm de se reinventar. “Este momento delicado também nos mostrou o quanto é necessário estarmos prontos para adversidades e, principalmente, para inovar. Acredito que nos ensinou ainda o quanto as pessoas se importam e querem fazer a diferença, tornando-se mais exigentes e buscando uma maior responsabilidade social e ambiental. Em resumo, a principal lição talvez seja essa ― a de colaboração: as pessoas irão cada vez mais olhar para dentro e contribuir para fora”, conclui.