Ainda lembro das minhas férias de Julho. Brincávamos na rua e utilizávamos o asfalto como quadra, cujas marcações eram feitas com tijolos roubados em construções. Futebol, vôlei e taco eram os jogos preferidos. Esconde-esconde, pega-pega e polícia e ladrão também faziam parte, fosse em garagens alheias ou terrenos baldios, num tempo em que os muros eram baixos e os portões não raro, eram apenas fechados. Este era o meu mundo analógico.
Hoje, apesar de viver em um condomínio fechado, com todas as possibilidades de brincar daquilo que fazia há quarenta anos atrás, vejo crianças preferirem a comodidade do ar condicionado, as redes sociais, o bate papo via WhatsApp, a curtição de fotos no Instagram, as séries americanas enlatadas e os vídeo games, os quais parecem levá-los a outra dimensão, tamanha concentração e imersão. Este é o mundo digital.
Utilizo e aprecio as comodidades trazidas pela tecnologia, as quais ajudam a ganhar tempo e produtividade, seja para pagar uma conta, pegar um táxi, embarcar em um voo, agendar uma consulta ou comprar um livro. Inegável também o poder de barganha que ganhamos como consumidores, podendo encontrar produtos, comparar preços, reclamar, elogiar e compartilhar boas e más experiências.
Porém creio que as empresas têm exagerado na dose com que se utilizam destas plataformas, distanciando-se e criando barreiras a seus consumidores, seja através da utilização de portais de comercio eletrônico, serviços de auto atendimento ou centrais pasteurizadas do tipo: tecle 1, tecle 2, tecle 5000.
Com informações cada vez mais fáceis e disponíveis, já que passamos cada vez mais tempo online, as empresas têm investido em sistemas e softwares para processamento e análise de exa, peta e zettabytes de informações, buscando algoritmos que indiquem correlações e tendências de compras acertando, na maioria das vezes, um outro produto ou site de interesse.
Li outro dia “Satisfação Garantida de Tony Hsieh”, empreendedor e fundador da Zappos, empresa de comércio eletrônico que faturou mais de 1 bilhão de dólares comercializando tênis e sapatos, cujo sucesso baseia-se num modelo híbrido interessante. Tony acredita que todo e qualquer contato telefônico é uma possibilidade de encantar o cliente, mesmo em um modelo no qual menos de 5% das vendas é realizada através deste canal.
Ao contrário das métricas baseadas em número de ligações e tempo de atendimento, não há scripts ou tempos pré-determinados na Zappos, incentivando os atendentes a utilizar seu bom senso e criar ligações emocionalmente pessoais, denominadas internamente de LEP. Consultorias de estilo e redirecionamento a sites da concorrência são fatos corriqueiros, mesmo que uma venda seja perdida. Pura construção e gerenciamento da marca.
Em um mercado competitivo como da Zappos, Tony utilizou de maneira inteligente o melhor dos mundos analógicos e digitais, cruzando as estratégias de intimidade com o cliente e excelência operacional, apregoadas pelos autores Michael Treacy e Fred Wiersma em seu livro “The Discipline of Market Leaders”.
Considerando o cenário econômico atual, aproximar-se de seus clientes nunca foi tão importante. Entender o que precisam e satisfazer suas necessidades fará a diferença entre sobreviver ou morrer. Então saia da frente do computador, desconecte-se das redes sociais, desligue o celular e invista em relacionamentos analógicos, os quais felizmente continuarão vivos, mesmo que as férias digitais da molecada mostrem o contrário.
Marcos Morita é executivo, professor, palestrante e consultor. Sua palestra, As 4 Chaves do Pensamento Estratégico, vista por centenas de executivos, aborda de maneira lúdica e participativa, temas como definição de metas, inovação, gerenciamento do tempo e motivação.